Projeto leva cinema itinerante aos becos do Complexo da Maré
Iniciativa foi tomada por um músico, que arrecadou dinheiro através da reciclagem de óleo de cozinha.
Por ser um país de dimensões continentais, o Brasil apresenta diversas características culturais e regionais. Essas distintas adversidades, somada a desigualdade escancarada diariamente, faz com que as pessoas atribuem as comunidades um status de local perigoso. Claro que não dá para negar que esses problemas existem – como acontece em todos os cantos do nosso país. Porém, diversas iniciativas estão buscando apresentar opções culturais para que os jovens que vivem por lá possam optar pela via cultural em vez de seguir por um caminho que pode causar prejuízos para uma geração promissora.
De Ramos para Maré
Para esta iniciativa nascer, foi necessária muita sabedoria do músico Lindenberg Cícero da Silva, de 62 anos. Criado na Praia de Ramos, Zona Norte do Rio, ele cresceu tendo os banhos na Baía de Guanabara e o almoço com peixes vindos diretamente dos pescadores da região como opções de lazer. Diante do estado de deterioração da Baía de Guanabara, ele resolveu coletar óleo de cozinha que era descartado pelos moradores para reciclagem. Essa iniciativa permaneceu mesmo com sua mudança para a Maré, também na Zona Norte. Com todo o dinheiro que ele arrecadou, foi possível elaborar um cinema itinerante, que leva a sétima arte para aqueles que não têm condições financeiras para ir a um cinema tradicional.
Em entrevista ao portal G1, ele afirmou que conseguiu gravar um CD com o dinheiro do óleo e que realizou a divulgação com a sua simples bicicleta na comunidade.
“Em uma dessas voltas, um menino cutucou meu ombro e perguntou ‘tio, cadê o cinema?’. Ele se referia a uma ONG que passa filmes na Maré, mas que foi embora. Aquilo ficou martelando na minha cabeça por dias e eu decidi fazer algo a respeito”, confirma o músico, conhecido como Bhega.
Neste projeto, intitulado Cineminha no Beco, aproximadamente 90 crianças se reúnem, uma vez por mês, em um beco ou viela da Maré, e assistem juntas a filmes. Só no ano passado, o programa atingiu a marca de 148 exibições. Mesmo com o projeto seguindo em pleno vapor desde 2014, o músico relata a emoção dos pais ao verem os filhos assistindo aos filmes. Bhega destaca também o interesse dos adultos pela sétima arte, já que muitos nunca entraram em uma sala de cinema.
Como tudo na vida, nada começa da maneira que imaginamos. Não ia ser diferente com o Cineminha do Beco. Bhega diz que, para cada litro de óleo coletado, o retorno era de apenas R$ 1. Além da dificuldade de buscar tanto óleo, ele ainda precisava do transporte até o centro de reciclagem, que fica em Bonsucesso. Através da ajuda de um comerciante, ele ganhou um projetor. O músico conseguiu adquirir uma lona e algumas cadeiras.
Hoje o projeto funciona do seguinte modo: Bhega estaciona a Tuk Tuk – espécie de triciclo, que ganhou há anos em um programa de TV – ajusta as poucas cadeiras, muitas doadas, para a grande quantidade de crianças, e distribui pipoca, que ele mesmo faz, com a ajuda da esposa e da filha.
Agora, o artista quer comprar uma lona melhor para proteger as crianças da chuva e conseguir mais cadeiras para o projeto. Quem se interessar em doar, pode entrar em contato pela página do Facebook do Cineminha no Beco.
A situação das favelas no Brasil
De acordo com dados oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, coletados durante o Censo de 2010, cerca de 11,4 milhões de pessoas viviam em aglomerados subnormais. O IBGE identificou 6.329 favelas em todo o país, localizadas em 323 dos 5.565 municípios brasileiros. Só no Rio de Janeiro, segundo o mesmo Censo, 1.702.073 pessoas ocupam este espaço. Muitas delas ficam afastadas de atividades culturais por conta das dificuldades impostas diariamente. No entanto, existem várias iniciativas, como a do Cineminha do Beco, que pode estreitar o caminho dessas pessoas com a cultura.
Redação por Adriano Dias
01/02/2020 – 15h42
Fonte: G1
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